Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados (Mt 5.4).
Introdução
Talvez
não haja melhor afirmação da mensagem das bem-aventuranças do que o ditado de
G. K. Chesterton: Nada tem sucesso como o
fracasso. E quando estudamos as bem-aventuranças podemos notar que é
justamente esta a mensagem que Jesus estava passando ao povo. Naturalmente,
Jesus não estava falando de fracasso real, mas do que os homens tem convencionalmente
chamado de fracasso, o que, na lição de hoje é chorar.
O
Sermão da Montanha foi, primeiramente, dirigido a um mundo no qual os fariseus
tinham conseguido desvirtuar muito do significado da Lei de Moisés. E nós
vivemos em um mundo que transformou o Evangelho de Cristo em pouco mais do que
civilidade, pois a Palavra de Deus tem sido severamente desprezada e atenuada
por inúmeros lideres religiosos. O Evangelho tem sido aparado para ajustar-se
ao estilo de vida dos homens indisciplinados e indulgentes.
Por
esta razão, é da maior importância que olhemos frequente e cuidadosamente para
o sermão do Filho de Deus que mais do que qualquer outro, define a própria
essência do Reino do Céu. Aqui, se ouvirmos humildemente as palavras deste
sermão, nossas vidas poderão ser transformadas, nossos espíritos revigorados e
nossas almas salvas.
A
lição de hoje vai nos ajudar a entender o quanto devemos lamentar o pecado,
tanto os meus como dos outros, e esperar confiante pelo tempo em que não mais
haverá sofrimento porque nosso Supremo Pastor enxugará dos nossos olhos toda
lágrima.
1 – CHORAR: UM APARENTE FRACASSO
Os
homens têm sido ensinados para acreditarem que as lágrimas têm que ser evitadas
para se ganhar a felicidade, que as lágrimas são para os fracos e não para os
fortes. Jesus simplesmente diz que isto não é verdade, que quem chora pode não
ser um fracassado, mas um vencedor.
A
cruz é exemplo de um aparente fracasso. Ela foi, certamente, um desastre
colossal por qualquer padrão convencional do mundo. Ela só parece certa a
muitos de nós agora, porque consentimos em dezenove séculos de tradição bem
estabelecida na História, mas na época de Jesus ela era escândalo, fracasso,
vergonha, maldição.
Não
é tão notável, então, que um Reino destinado a ser elevado ao poder sobre uma
vergonhosa cruz fosse tão cheio de surpresas e que Jesus dissesse que somente
aqueles que fossem aparentemente fracassados tivessem alguma esperança em suas
bênçãos?
A – A realidade do choro
Na
vida, certamente, não falta motivos para chorar. Mães perdem seus filhos
prematuramente. Maridos ou esposas vêem seus companheiros definhando por alguma
doença. Pais de família mergulham no desemprego e já não sabem o que fazer para
sustentar seus filhos. Pais vêem suas vidas serem transformadas quando algum
filho entra no mundo das drogas. Famílias são separadas pelo egoísmo dos pais. Estes
e muitos outros motivos nos fazem chorar.
Somente
os de coração sobremodo endurecidos é que não derramam lágrimas diante do
quadro em que vivemos. Ao ver tantas pessoas passando fome em vários países e até
mesmo no nosso; ao ver o rastro de destruição que as drogas, as bebidas e a
violência têm causado; ao ver o domínio do pecado na maioria das pessoas,
escravizando-as, cegando-as, condenando-as; ao ver a violência das guerras
causando tanto sofrimento e tantas mortes, realmente, só contém suas lágrimas
os que têm posto as mãos aos olhos e aos ouvidos e recusam-se a admitir que o
sofrimento é o sentimento mais comum encontrado neste mundo. Mas há algo de bom
no choro.
B – O benefício do choro
Deus,
na sua sabedoria, não permitiu que este sentimento comum presente na vida de
todos nós fosse algo em vão. A aflição, que é inevitável aos homens mortais,
pode ter efeitos saudáveis sobre nossas vidas, se permitirmos que assim seja. O
sábio Salomão assim escreveu sobre ela:
2 Melhor
é ir à casa onde há luto do que ir à casa onde há banquete, pois naquela se
vê o fim de todos os homens; e os vivos que o tomem em consideração.
3 Melhor
é a mágoa do que o riso, porque com
a tristeza do rosto se faz melhor o coração.
4 O
coração dos sábios está na casa do luto, mas o dos insensatos, na casa da
alegria (Ec 7.2-4).
A
aflição pode nos lembrar da tênue transitoriedade de nossas vidas e nos pôr a
pensar seriamente sobre as coisas mais importantes da vida. O salmista, que nos
deu tão rica meditação sobre a grandeza da Lei de Deus, ligou a dor com o
entendimento ao dizer:
67 Antes de ser afligido, andava errado, mas agora guardo a tua
palavra (Sl 119.67).
E
ele, então, conclui:
71 Foi-me bom ter eu passado pela aflição,
para que aprendesse os teus decretos (Sl 119.71).
A
verdade é que as lágrimas têm sempre nos ensinado mais do que os risos sobre as
veracidades da vida. Somente um Deus Soberano, terno de amor e de misericórdia,
poderia ser tão sábio em permitir que se extraia algo bom de algo tão trágico.
2 – O SUCESSO NÃO ESTÁ NO CHORO, MAS SIM
NOS MOTIVOS
Choramos
sim, isso é verdade, e encontramos nesta bem-aventurança um dos maiores
consolos para os momentos de choro. Mas, para ser bem-aventurado, há algo mais
sobre o choro além das lágrimas que não podemos evitar, além da tristeza que
vem sem ser chamada e nem procurada. Este algo mais são os motivos do choro. E
quais são estes motivos?
A – O choro deve ser
motivado pelo pecado
Não
podemos pensar que Jesus está dizendo que simplesmente os que choram ou sofrem
são bem-aventurados e serão consolados. Por exemplo, Ele não afirma que alguém
que está de luto é feliz em virtude do luto. Jesus, ao dizer: bem-aventurados
os que choram, não está brincando com o sentimento das pessoas. Também não são
todos os que estão chorando que encontrarão consolo, somente aqueles que estão
chorando pela motivação correta.
Jesus
aqui está chamando a atenção para um tipo especial de pessoas que estão tristes
e por isso choram. E estão tristes por quê? Por causa do pecado! Estes são os
que encontrarão o consolo de Deus! É a “humildade de espírito” do verso
anterior. É o que reconhece a sua falência espiritual. São felizes os que
choram por causa do pecado.
As
bem-aventuranças não foram frases ditas ao acaso. Há ligações entre as várias
declarações de Jesus. Primeiro Jesus disse que os humildes de espírito eram
bem-aventurados. Depois, disse que os que choram também são bem-aventurados.
Que relação há entre os humildes e os que choram? Simples: Eles choram porque
são pobres de espírito. A pobreza de espírito significa o reconhecimento de
nossa condição indigna diante de Deus.
Todos
choram por algum motivo neste mundo, mas o choro ao qual Jesus se refere é
motivado por algo específico. Para Jesus as únicas pessoas realmente felizes
são aquelas que lamentam o pecado. E de acordo com as Escrituras, o pecado é a
causa de todas as desgraças que permeiam a humanidade. São estes a quem Isaías
se refere quando fala sobre o Ungido do Senhor:
1 O Espírito do SENHOR Deus está sobre mim,
porque o SENHOR me ungiu para pregar
boas-novas aos quebrantados, enviou-me a curar os quebrantados de coração,
a proclamar libertação aos cativos e a pôr em liberdade os algemados;
2 a apregoar o ano aceitável do SENHOR e o dia
da vingança do nosso Deus; a consolar
todos os que choram
3 e a pôr sobre os que em Sião estão de luto
uma coroa em vez de cinzas, óleo de alegria, em vez de pranto, veste de louvor,
em vez de espírito angustiado; a fim de que se chamem carvalhos de justiça,
plantados pelo SENHOR para a sua glória (Is 61.1-3).
Estas
palavras foram aplicadas somente àqueles que haveriam de ser humilhados e
entristecidos através das aflições por seus pecados. A tristeza por causa do
pecado deve ser inevitável em nossa vida, ela tem que ser abraçada porque a
verdadeira felicidade, a verdadeira paz e a verdadeira vitória são impossíveis
sem ela. Esta é a tristeza segundo Deus, sobre a qual Paulo escreve:
10 Porque a
tristeza segundo Deus produz arrependimento para a salvação, que a ninguém
traz pesar; mas a tristeza do mundo produz morte (2 Co 7.10).
Uma
tristeza que produz arrependimento para a salvação. Esta é a tristeza que precisamos
sentir. Esta é a tristeza que conduz o pecador ao arrependimento e o leva a confessar
os seus pecados.
B – A motivação maior devem ser meus
próprios pecados
O
verdadeiro crente, antes do que por qualquer outro motivo, chora pelos seus
próprios pecados. Os humildes de espírito reconhecem sua condição espiritual.
Entretanto, uma coisa é reconhecer tal condição e outra é chorar por causa
dela, sentindo a dor aguda de ter desagradado a Deus, pois muitos reconhecem,
mas poucos choram.
Esse
sentimento de choro por causa do pecado está em baixa nos dias atuais. As
pessoas não querem mais ouvir falar de pecado e os pregadores tem, em grande
medida, satisfeito essa vontade do povo, pregando somente sobre a vitória, mas
deixando de lado a batalha para se chegar até ela.
O
evangelismo moderno tem enfatizado a importância de se colocar de lado a baixa
auto-estima; tem afirmado que todo crente é um vencedor, que ele só precisa
decretar e tudo vai acontecer porque é filho do Rei; que ele não é cauda, e sim
cabeça. Não foi assim que Jesus ensinou nas bem-aventuranças, não foi está a
ideia que Ele passou no Sermão da Montanha.
Nos
dias de hoje, pouco ou nada se tem falado a respeito da necessidade de
santidade e do quanto o pecado é terrível aos olhos de Deus. Os crentes não têm
sido ensinados a lamentar seus pecados. No máximo, recebem algum comentário
superficial, mas poucas são as igrejas que ajudam as pessoas a ver o quanto o
coração pode ser enganoso. Poucas ensinam a chorar por causa do pecado. A
verdade é que os crentes precisam sentir mais a tristeza segundo Deus e devem
orar como o profeta Daniel:
7
A Ti, ó Senhor, pertence a justiça, mas
a nós, o corar de vergonha... (Dn 9.7)
Lágrimas
assim não são desprezadas por Deus, ao contrário, Ele está muito mais perto de quem
chora do que de quem jubila:
17
Sacrifícios agradáveis a Deus são o
espírito quebrantado; coração compungido e contrito, não o desprezarás, ó
Deus (Sl 51.17).
Estas
são as lágrimas que temos que derramar, renunciando ao nosso orgulho obstinado,
e chegar ao inenarrável conforto de um Deus que perdoa a todos que choram pelos
seus pecados, tomando-nos para Ele para, finalmente, enxugar dos nossos olhos
toda lágrima.
C – Esta motivação deve se estender aos
pecados dos outros
Quem
nasce de novo, no dizer de William Hendriksen, “aprende a amar a Deus a um nível tal que começará a chorar por causa de
todas as obras ímpias que os ímpios tem feito impiamente.” Encontramos nas
Escrituras larga evidência a respeito de tal choro. Chorar pelos pecados dos
outros não significa chorar porque nós mesmos somos ofendidos ou magoados, mas
porque entendemos que o pecado ofende a Deus, a quem tanto amamos. O salmista diz:
136 Torrentes de
água nascem dos meus olhos, porque os
homens não guardam a tua lei (Sl 119.136).
E
temos o exemplo de Esdras que muito pranteou por causa do pecado do povo:
6 Esdras se
retirou de diante da Casa de Deus, e entrou na câmara de Joanã, filho de
Eliasibe, e lá não comeu pão, nem bebeu água, porque pranteava por causa da transgressão dos que tinham voltado do
exílio (Ed 10.6).
A
visão de Ezequiel da ira de Deus por uma Jerusalém corrupta também revelou mais
claramente a mesma coisa:
4 e lhe disse: Passa pelo meio da cidade, pelo
meio de Jerusalém, e marca com um sinal
a testa dos homens que suspiram e gemem por causa de todas as abominações que
se cometem no meio dela.
5 Aos outros disse, ouvindo eu: Passai pela
cidade após ele; e, sem que os vossos olhos poupem e sem que vos compadeçais,
matai;
6 matai a velhos, a moços e a virgens, a
crianças e a mulheres, até exterminá-los; mas
a todo homem que tiver o sinal não vos chegueis; começai pelo meu santuário
(Ez 9.4-6).
Somente
aqueles que suspiram e gemem por causa de todas as abominações que se cometem
deverão ser poupados. Os profetas queriam que entendêssemos este choro como a
aflição experimentada por aqueles que, em sua reverência por Deus, estão
horrorizados por seus próprios pecados e de seus companheiros, e, por causa
disso, são comovidos às lágrimas de amarga vergonha e aflição. Mas, com
certeza, o homem que mais sofreu por causa dos pecados do povo foi o próprio
Senhor Jesus. Ele disse:
37
Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te foram
enviados! Quantas vezes quis eu reunir os teus filhos, como a galinha ajunta os
seus pintinhos debaixo das asas, e vós não o quisestes (Mt 23.37)!
Ele
que chorou frente ao túmulo de Lázaro, talvez comovido pelo poder malévolo do
pecado que introduziu a morte e o sofrimento no mundo. Ele que carregou os
pecados dos homens sobre Si e morreu para salvar o seu povo, sabia o que era
sofrer e chorar pelo pecado dos homens. Na cruz pode dizer dos seus algozes:
34
Contudo, Jesus dizia: Pai,
perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem... (Lc 23.34)
O
crente verdadeiro chora ante toda a dureza de coração dos homens que se recusam
a aceitar o amoroso Salvador que desceu do céu, fez-se homem de dores e padeceu
a morte para proporcionar uma salvação eterna e maravilhosa.
3 – O SUCESSO: A CONSOLAÇÃO DE DEUS
Jesus
disse: Os que choram serão consolados. O segredo da felicidade não está no
choro, mas no consolo dado por Deus. A palavra “consolados” que Jesus usa aqui
é a mesma utilizada para referir-se ao Espírito Santo em João 14:
16 E Eu rogarei ao Pai, e Ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para
sempre convosco (Jo14.6).
O
Espírito Santo seria o segundo Consolador, uma vez que Jesus foi o primeiro. Dizemos
que felizes são os que estão tristes porque recebem verdadeira consolação, pois
também o mundo oferece diferentes tipos de consolação. Mas é uma alegria
superficial e um consolo que não dura nem satisfaz. John R. W. Stott diz: “Estas pessoas que choram, que lamentam a sua
própria maldade, serão consolados pelo único consolo que pode aliviar o seu
desespero, isto é, o perdão da graça de Deus.”
Portanto,
se choramos por causa do pecado dos homens que ofendem a Deus, veremos a glória
de Deus manifestar-se executando juízo sobre toda a carne; se choramos por nossos
próprios pecados, recebemos de Deus o perdão e a promessa do esquecimento
deles, pois a Bíblia diz que:
19 Tornará a ter
compaixão de nós; pisará aos pés as
nossas iniquidades e lançará todos os nossos pecados nas profundezas do mar (Mq
7.19).
34 ...Pois
perdoarei as suas iniquidades e dos seus
pecados jamais me lembrarei (Je 31.34).
Mas
por mais que recebamos a consolação por saber que nossos pecados estão
perdoados, ainda choramos devido às consequências que o pecado tem deixado no
mundo.
O
consolo prometido por Deus já pode ser sentido na presente vida, mas será
completo na vida futura e eterna, quando não haverá mais choro, nem dor, nem
morte, nem pecado. João escreveu:
27 Nela, nunca jamais penetrará coisa alguma
contaminada, nem o que pratica abominação e mentira, mas somente os
inscritos no Livro da Vida do Cordeiro (Ap 21.27).
3 Nunca mais haverá qualquer maldição.
Nela, estará o trono de Deus e do Cordeiro. Os seus servos o servirão (Ap
22.3).
4 E lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e a
morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as
primeiras coisas passaram (Ap 21.4).
Enquanto
esse dia não chega, podemos responder à primeira pergunta do Catecismo de
Heidelberg: “Qual é teu único consolo tanto na vida quanto na morte?”
Resposta:
“Que eu, com corpo e alma, não me pertenço a mim mesmo, senão a meu fiel
Salvador Jesus Cristo, que me livrou do poder do diabo, satisfazendo
inteiramente com seu precioso sangue por todos os meus pecados, e me guarda de
tal maneira que sem a vontade de meu Pai celestial nem um só cabelo de minha
cabeça pode cair, antes é necessário que todas as coisas sirvam para minha
salvação. Por isso também me assegura, por seu Espírito Santo, a vida eterna e
me faz pronto e aparelhado para viver em diante sua vontade.” Amém!
Muitas
vezes nos sentimos meio desesperados porque nossos corações não confiam em
Cristo e na sua volta, mas nas vantagens deste mundo. É triste quando isso
acontece, porque com isso perdemos a expectativa da segunda vinda de Cristo,
que é um verdadeiro consolo para nós.
Conclusão
Nas
bem-aventuranças Jesus deixa bem claro que o Reino do Céu pertence não aos
cheios, mas sim aos vazios, não aos felizes, mas sim aos infelizes, não aos
ricos, mas sim aos pobres, não aos vitoriosos, mas sim aos fracassados.
O
grande prêmio prometido aos que choram, segundo Jesus, é que eles, e somente
eles, serão consolados. São bem-aventurados, pois o consolo verdadeiro somente
é dado para os que lamentam sua condição espiritual e a condição espiritual
depravada deste mundo! Que Deus lhe abençoe, que Ele fortaleça e console seu coração
e que Ele enxugue de seus olhos toda lágrima. Amém!
Luiz
Lobianco
luizlobianco@hotmail.com
Bibliografia:
Bíblia Sagrada. Traduzida em português por João Ferreira de Almeida.
Revista e Atualizada no Brasil. Sociedade Bíblica do Brasil.
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